5 DE OUTUBRO
33. DIA DE AÇÃO DE GRAÇAS E DE PETIÇÃO
– Ser agradecidos. Imitar o Senhor.
– Inúmeros motivos para dar graças continuamente.
– Pedir com confiança. Recorrer à Virgem nos nossos pedidos.
Hoje a Igreja convida-nos a fazer um balanço dos benefícios que recebemos de Deus, para dar graças, e do muito que ainda nos falta, tanto no plano material como no espiritual, para pedi-lo ao nosso Pai-Deus, que está sempre disposto a conceder-nos aquilo de que precisamos.
I. COROASTE O ANO com a tua bondade, Senhor, e serás a esperança de todos os confins da terra1.
As Têmporas são dias de ação de graças que a Igreja eleva a Deus quando terminam no hemisfério Norte as colheitas e o período anual de descanso. É também um dia propício para pedirmos ao Senhor que nos ajude a recomeçar com brio as tarefas profissionais2.
Agradecer e pedir são dois modos de nos relacionarmos diariamente com o nosso Pai-Deus. É muito o que precisamos; é muito o que devemos agradecer. Em primeiro lugar, temos de ser conscientes dos dons do Senhor, “porque se não conhecemos aquilo que recebemos, não despertamos para o amor”3. Não sabemos amar se não somos agradecidos. Toma cuidado e não te esqueças do Senhor teu Deus – lemos na primeira Leitura da Missa – [...] Não suceda que, depois de teres comido e estares saciado, e teres edificado belas casas e morares nelas, e teres manadas de bois e rebanhos de ovelhas e abundância de prata e de ouro e de todas as coisas, o teu coração se empertigue, e não te lembres do Senhor teu Deus, que te tirou da terra do Egito, da casa da servidão, e que foi o teu guia no imenso e terrível deserto, onde havia dragões de sopro ardente e escorpiões, e falta completa de água; e que fez brotar arroios da pedra duríssima4.
A vida de Jesus, nosso modelo, é uma contínua ação de graças ao Pai. No momento em que vai ressuscitar Lázaro, o Senhor exclama: Pai, dou-te graças porque me tens ouvido5. Na multiplicação dos pães, Jesus tomou os pães e, tendo dado graças, distribuiu-os pelos que estavam sentados; e igualmente os peixes, quantos eles queriam6. Na instituição da Eucaristia, deu graças7 antes de pronunciar as palavras sobre o pão e o vinho. E fez o mesmo em muitas outras ocasiões. Por isso, “podemos dizer – afirma o Papa João Paulo II – que a sua oração e toda a sua existência terrena se converteram em revelação dessa verdade fundamental enunciada pela Epístola de São Tiago: Toda a dádiva excelente e todo o dom perfeito procedem do alto e descem do Pai das luzes... (Ti 1, 17)”.
A ação de graças “é como uma restituição, porque todas as coisas têm em Deus o seu princípio e a sua fonte. Gratias agamus Domino Deo nostro: é o convite que a Igreja coloca no centro da liturgia eucarística”8. Não há nada mais justo e necessário do que darmos graças ao Senhor durante todos os dias da nossa vida, sem esquecermos que a “maior prova de agradecimento a Deus é amarmos apaixonadamente a nossa condição de filhos seus”9. Hoje, a Igreja no-lo recorda especialmente.
II. A PRINCIPAL CENSURA que São Paulo dirige aos pagãos é que, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus nem lhe deram graças10. Não sejamos ingratos.
Este ano – pelo qual damos graças – esteve repleto de dons do Senhor. Uns foram claros e visíveis; outros, às vezes mais valiosos, ficaram ocultos: perigos para a alma e para o corpo de que o Senhor nos livrou; pessoas que conhecemos e que terão uma importância decisiva na nossa salvação; graças e ajudas que nos passaram desapercebidas; e até acontecimentos que nos pareceram negativos (uma doença, um fracasso profissional...) e que não demoraremos a ver que foram um presente de Deus. Toda a nossa vida é um bem imerecido.
As ações de graças devem, pois, ser contínuas: devem ser atos de piedade e de amor praticados sem interrupção. Compreendemos que, no Prefácio da Santa Missa, a Igreja nos recorde diariamente que é nosso dever e salvação dar-Vos graças, Senhor, nosso Pai, sempre e em todo o lugar, mesmo quando chegam a dor e a doença. Meu Deus, obrigado! E a alma enche-se de paz, porque compreende que Deus tirará muito fruto daquilo que parece pouco grato ou indesejável. “Esse obrigado é como o lenho que Deus mostrou a Moisés e que, lançado nas águas amargas, as transformou em água doce (cfr. Êx 15, 25)”11.
O Fundador do Opus Dei costumava recomendar aos seus filhos que dessem graças ao Senhor pro universis beneficiis tuis... etiam ignotis, por todos os seus benefícios, incluídos os que nos passaram despercebidos12. Possivelmente “um dos nossos maiores rubores ao chegarmos ao Juízo procederá daí: da imensa quantidade de presentes divinos que não soubemos apreciar e agradecer como tais; dos desgostos desnecessários que tivemos com acontecimentos que nos pareceram indiferença divina para com as nossas orações. Ao menos então daremos graças ao Senhor, envergonhados por Ele ter tido a bondade de não escutar tantos pedidos néscios que lhe fizemos. É muito possível que, se tivesse feito caso das nossas orações e atendido literalmente aos nossos pedidos, tivéssemos que escutar no último dia as mesmas palavras que dirigiu ao atormentado epulão, triunfador nesta terra: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em vida (Lc 16, 25)”13.
Que surpresa quando descobrirmos que os homens, com um pouco mais de fé e de sentido sobrenatural, teriam podido ver um grande bem em muitos dos acontecimentos que lhes pareceram um mal! A nossa gratidão está muito relacionada com o Céu, do qual é já uma antecipação, mas também com o Purgatório. “Como agradeceremos ao Senhor os dissabores que permitiu na nossa vida! São delicadezas de um Pai que deseja ver os seus filhos limpos, purificados, prontos para comparecer diante dEle, imediatamente, ao concluírem a sua viagem por este mundo. Como nos ama, não quer para nós a dilação de um imprescindível Purgatório, e faz-nos o favor de facilitá-lo nesta vida. No fim, dar-lhe-emos graças sobretudo por ter acolhido em particular uma das nossas orações: essa pela qual pedimos com a Igreja spatium verae poenitentiae, oportunidade para uma verdadeira e frutuosa penitência”14.
Damos graças ao Senhor em todo o tempo e lugar, em qualquer circunstância, mas de modo muito particular na Santa Missa, a ação de graças por excelência. E com a Liturgia da Missa, dizemos-lhe: Ó Deus, nós Vos oferecemos este sacrifício de louvor pelos benefícios recebidos; ajudai-nos a atribuir ao vosso nome o que nos concedestes sem o merecermos15.
III. E COM A AÇÃO DE GRAÇAS contínua, a petição reiterada, porque são muitos os auxílios de que necessitamos. Se bem que o Senhor nos concede efetivamente muitos dons sem que nós lho peçamos, dispôs que nos concederia outros tendo em conta a força da oração dos seus filhos. E como não sabemos qual a medida da oração que a sua insondável Providência espera para nos conceder essas graças, é necessário que peçamos incansavelmente: É preciso orar sempre e não desfalecer16. E do Evangelho da Missa17 tiramos a plena certeza de que as nossas orações serão sempre atendidas. O próprio Senhor se apresenta como fiador da sua palavra: tudo o que pedirmos e for para nosso bem, ser-nos-á sempre concedido. Pedi e ser-vos-á dado; buscai e achareis; batei e abrir-se-vos-á. Porque todo o que pede recebe; e o que busca encontra; e a quem bate, abrir-se-lhe-á.
Há, além disso, uma outra razão para sermos perseverantes nas nossas súplicas: quanto mais pedimos, mais nos aproximamos de Deus, mais cresce a nossa amizade com Ele. Na terra, quando temos de pedir um favor a uma pessoa, procuramos alguém que sirva de intermediário, esperamos pelo momento oportuno, em que a pessoa esteja bem disposta... No caso do nosso Pai-Deus, sempre o encontramos disposto a escutar-nos. Há porventura algum de vós que, se o seu filho lhe pedir pão, lhe dará uma pedra? E, se lhe pedir um peixe, dar-lhe-á uma serpente? Se vós, pois, sendo maus, sabeis dar coisas boas aos vossos filhos, quanto mais o vosso Pai, que está nos céus, dará o bom espírito aos que lho pedirem? Dispomos de todos os motivos para recorrer com confiança a Deus. Nada pode enfraquecer essa fé, nada pode legitimamente atenuá-la.
E o que devemos pedir? “Quem não tem coisas a pedir? Senhor, essa doença... Senhor, esta tristeza... Senhor, aquela humilhação que não sei suportar pelo teu amor... Queremos o bem, a felicidade e a alegria das pessoas da nossa casa; oprime-nos o coração a sorte dos que padecem fome e sede de pão e de justiça; dos que experimentam a amargura da solidão; dos que, no fim dos seus dias, não recebem um olhar de carinho nem um gesto de ajuda.
“Mas a grande miséria que nos faz sofrer, a grande necessidade que queremos remediar, é o pecado, o afastamento de Deus, o risco de que as almas se percam por toda a eternidade”18.
Temos um caminho, que a Igreja sempre nos mostrou, para que as nossas orações cheguem mais prontamente à presença de Deus. Esse caminho é a mediação de Maria, Mãe de Deus e Mãe nossa. E entre as orações que a piedade cristã dirigiu a Santa Maria ao longo dos séculos, o Santo Rosário, que a Igreja nos propõe como devoção particular neste mês de outubro, sempre foi um caminho eficaz para todas as petições, para todas as necessidades. “Não deixeis de inculcar com todo o cuidado a prática do Rosário – aconselhava Pio XI –, a oração tão querida da Virgem e tão recomendada pelos Sumos Pontífices, por meio da qual os fiéis podem cumprir mais suave e eficazmente o preceito divino do Mestre: Pedi e recebereis, buscai e achareis, batei e abrir-se-vos-á”19. Não façamos ouvidos surdos ao conselho.
(1) Cfr. Sl 64, 12.6; Antífona da comunhão da Missa do dia 5 de outubro; (2) cfr. J. A. Abad-M. Garrido Boñano, Iniciación a la liturgia de la Iglesia, Palabra, Madrid, 1988, pág. 666; (3) Santa Teresa, Vida, 10, 3; (4) Deut 8, 11-15; Primeira leitura da Missa do dia 5 de outubro; (5) Jo 11, 41; (6) Jo 6, 11; (7) Lc 22, 17; (8) João Paulo II, Audiência geral, 29-VII-1987; (9) Josemaría Escrivá, Forja, n. 333; (10) Rom 1, 21; (11) J. Tissot, La vida interior, Herder, Barcelona, 1971, pág. 321; (12) cfr. S. Bernal, Perfil do Fundador do Opus Dei, pág. 151; (13) J. M. Pero-Sanz, La hora sexta, Rialp, Madrid, 1978, pág. 274; (14) ib., pág. 275; (15) Oração sobre as oferendas da Missa do dia 5 de outubro; (16) Lc 18, 1; (17) Mt 7, 7-11; (18) Josemaría Escrivá, Amar a Iglesia, págs. 77-78; (19) Pio XI, Enc. Ingravescentibus malis, 29-IX-1937.