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TEMPO COMUM. DÉCIMO PRIMEIRO DOMINGO. CICLO C

90. CONTRIÇÃO PELOS PECADOS

– A contrição faz com que nos esqueçamos de nós mesmos e nos aproximemos novamente do Senhor.

– Não podemos desconhecer as nossas faltas. Evitar as desculpas.

– Humildade para nos arrependermos. Confissão. Sinceridade.

I. LEMOS HOJE NO EVANGELHO da Missa1 que Jesus foi convidado a almoçar por um fariseu chamado Simão. Não se menciona o lugar, mas o episódio deve ter sucedido na Galiléia, talvez em Cafarnaum.

Simão não manifesta nenhuma particular estima por Cristo, pois não tem com Ele nem sequer esses detalhes de deferência habituais entre os judeus quando se recebia um hóspede importante: o ósculo das boas-vindas, a água perfumada para lavar-se, o ungüento...

Quando estavam à mesa, entra uma mulher e vai diretamente a Cristo. Era uma mulher pecadora que havia na cidade. Já devia conhecer o Senhor, e provavelmente ficara impressionada em alguma outra ocasião com as suas palavras ou com algum gesto da sua misericórdia. Hoje decide-se a ter um encontro pessoal com Ele. E dá amplas mostras de arrependimento e de contrição: Levou um vaso de alabastro de perfume, pôs-se atrás dEle junto aos seus pés, chorando, e começou a banhá-los com lágrimas, e enxugava-os com os cabelos da sua cabeça, e os beijava e os ungia com o perfume. Sabemos o que se passava no seu íntimo pelas palavras posteriores do Senhor: Amou muito. Mostrou que professava por Jesus uma veneração sem limites. Esqueceu-se dos outros e de si mesma; só Cristo é que lhe importava.

São-lhe perdoados os seus muitos pecados porque muito amou: esta e não outra foi a razão de tanto perdão. A cena termina com as consoladoras palavras do Senhor: A tua fé te salvou, vai em paz. Recomeça a tua vida com uma nova esperança.

A fé e a humildade salvaram aquela mulher do desastre definitivo; com a contrição, iniciou uma nova vida. E diz São Gregório Magno que “aquela mulher nos representou a todos os que, depois de termos pecado, nos voltamos de todo o coração para o Senhor e a imitamos no pranto da penitência”2. A contrição faz com que nos esqueçamos de nós mesmos e nos aproximemos novamente de Deus; e é também demonstração de um amor profundo, que atrai a misericórdia divina sobre as nossas vidas. Os meus olhares – diz o Senhor – pousam sobre os humildes e sobre os de coração contrito3. Os nossos piores defeitos e faltas, ainda que sejam muitos e freqüentes, não nos devem desanimar enquanto formos humildes e quisermos voltar arrependidos.

Peçamos ao Senhor que grave em nossas almas esta doutrina esperançadora, para não abrandarmos no empenho por ser santos, por alcançar o Amor de Deus. “Neste torneio de amor, não nos devem entristecer as nossas quedas, nem mesmo as quedas graves, se recorremos a Deus com dor e bom propósito, mediante o sacramento da Penitência. O cristão não é nenhum colecionador maníaco de uma folha de serviços imaculada. Jesus Cristo Nosso Senhor não só se comove com a inocência e a fidelidade de João, como se enternece com o arrependimento de Pedro depois da queda. Jesus compreende a nossa debilidade e atrai-nos a si como que por um plano inclinado, desejando que saibamos insistir no esforço de subir um pouco, dia após dia. Procura-nos como procurou os discípulos de Emaús, indo ao seu encontro; como procurou Tomé e lhe mostrou as chagas abertas nas mãos e no lado, fazendo com que as tocasse com os seus dedos. Jesus Cristo está sempre à espera de que voltemos para Ele, precisamente porque conhece a nossa fraqueza”4.

II. SIMÃO, CALADO, contempla a cena e menospreza no seu interior aquela mulher. Jesus a perdoou, e ele, erigindo-se em juiz, condena-a. Pensa também que Cristo, de quem tanto se vinha falando, não é um verdadeiro profeta. Talvez o tivesse convidado para observá-lo de perto.

Jesus irá demonstrar-lhe que não apenas conhece a alma daquela mulher, mas também os pensamentos do seu anfitrião: Simão – diz-lhe –, um credor tinha dois devedores: um devia-lhe quinhentos denários, o outro cinqüenta. Não tendo eles com que pagar, perdoou a ambos. Quem, pois, o amará mais?

A resposta era evidente: deveria amá-lo mais aquele a quem fora perdoada uma dívida maior. Simão respondeu corretamente. E então a parábola se tornou realidade. Ali estavam face a face os dois devedores. Em última análise, o que o Senhor diz a seguir é um grande louvor a essa mulher que nem sequer se atreve a falar. Por isso olha para ela enquanto parece falar com Simão. Na realidade, é para a mulher que fala. E voltando-se para a mulher, disse a Simão: Vês esta mulher? Entrei em tua casa e não me deste água para os pés; mas ela regou-me os pés com as suas lágrimas e enxugou-os com os seus cabelos. Não me deste... Tu não me amas, ela sim. Ama-me apesar dos seus muitos pecados, ou talvez por causa deles, pois é muito grande a necessidade que sente de ser perdoada.

Simão não ofereceu a Jesus os sinais de hospitalidade que eram costumeiros naquele lugar com os hóspedes importantes. Não lhe ofereceu água para lavar os pés cansados do caminho; não o cumprimentou com o ósculo da paz; não lhe fez ungir a cabeça com perfume. A mulher, no entanto, fez muito mais: lavou-lhe os pés, enxugou-os com os seus cabelos e não parava de beijá-los.

Simão não se apercebeu das suas faltas, como também não é consciente de que, se não cometeu mais pecados e mais graves, foi pela misericórdia divina, que o preservou do mal. “Ama pouco – comenta Santo Agostinho – aquele que é perdoado em pouco. Tu, que dizes não ter cometido muitos pecados, por que não os cometeste? Sem dúvida porque Deus te conduziu pela mão [...]. Não há nenhum pecado cometido por um homem que não possa ser cometido por outro, se Deus, que fez o homem, não o sustenta com a sua mão”5.

Não podemos esquecer a realidade das nossas faltas, nem atribuí-las ao ambiente, às circunstâncias que rodeiam a nossa vida, ou admiti-las como algo inevitável, desculpando-nos e fugindo da responsabilidade. Se o fizéssemos, fecharíamos as portas ao perdão e ao reencontro verdadeiro com Deus, tal como aconteceu com o fariseu. “Mais que o próprio pecado – diz São João Crisóstomo –, o que irrita e ofende a Deus é que os pecadores não sintam dor alguma dos seus pecados”6. E não pode haver dor se nos desculpamos das nossas fraquezas. Devemos, pelo contrário, examinar-nos em profundidade, sem nos limitarmos a aceitar genericamente que somos pecadores. “Não podemos ficar na superfície do mal – dizia o então Cardeal Wojtyla –; é preciso chegar à sua raiz, às causas, à verdade mais profunda da consciência”7. Jesus conhece bem o nosso coração e deseja limpá-lo e purificá-lo.

III. LEMOS NO SALMO RESPONSORIAL da Missa: Confessei-te, enfim, o meu pecado, dei-te a conhecer a minha falta. Eu disse: Confessarei ao Senhor os pecados que cometi. Perdoa, ó Senhor, o meu pecado: reconheço o mal que fiz. Tu és, Senhor, o meu refúgio; preservas-me da angústia, rodeias-me de cânticos de libertação8.

A sinceridade é salvadora: A verdade vos fará livres9, disse Jesus. O engano, a simulação e a mentira, pelo contrário, levam à separação do Senhor e à esterilidade nos frutos da caridade: O meu vigor tornou-se sequidão de estio10, diz o mesmo salmo.

A raiz da falta de sinceridade é a soberba: impede o homem de submeter-se a Deus, de saber o que Ele lhe pede, e torna-lhe ainda mais difícil reconhecer que atuou mal e retificar. Se esta atitude permanece, as disposições iniciais tomam corpo e dificultam cada vez mais a objetividade no conhecimento próprio: a alma não quer reconhecer as suas faltas, procurando desculpas para os seus erros; e assim chega à cegueira. Necessitamos, pois, de uma atitude humilde – como a da mulher pecadora – para crescermos no conhecimento próprio com sinceridade e assim confessarmos os nossos pecados.

A humildade permite-nos ver a grande dívida que temos com o Senhor e sentir a radicalidade da nossa insuficiência pessoal, inclinando-nos a pedir perdão a Deus muitas vezes ao dia pelas coisas que não vão bem na nossa vida ou, pelo menos, não vão tão bem quanto poderiam ir. Assim, as muitas faltas levam-nos a amar muito; as poucas, a agradecer a Deus, que com o seu amor não nos deixou cair. Se vivermos deste modo, sendo sinceros conosco próprios, não teremos motivo algum para nos constituirmos em juízes dos defeitos daqueles com quem convivemos.

Se este fosse profeta, saberia quem e qual é a mulher que o toca... A caridade e a humildade ensinam-nos a ver nas faltas e pecados dos outros a nossa própria condição fraca e desvalida, e ajudam-nos a unir-nos de coração à dor de todo o pecador que se arrepende, porque também nós cairíamos em faltas iguais ou piores se a misericórdia de Deus não nos sustivesse.

“O Senhor – conclui Santo Ambrósio – amou não o ungüento, mas o carinho; agradeceu a fé, louvou a humildade. E se tu desejas a graça, aumenta também o teu amor; derrama sobre o corpo de Jesus a tua fé na Ressurreição, o perfume da Igreja santa e o ungüento da caridade dos demais”11.

Peçamos à Santíssima Virgem, Refugium peccatorum – Refúgio dos pecadores – que nos obtenha do seu Filho uma dor sincera dos nossos pecados e um amor maior que as nossas faltas.

(1) Lc 7, 36; 8, 3; (2) São Gregório Magno, Homilia sobre os Evangelhos, 13, 5; (3) Is 66, 2; (4) Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 75; (5) Santo Agostinho, Sermão 99, 6; (6) São João Crisóstomo, Homilias sobre São Mateus, 14, 4; (7) Card. K. Wojtyla, Sinal de contradição, pág. 244; (8) Sl 31, 5-7; (9) cfr. Jo 8, 32; (10) Sl 31, 4; (11) Santo Ambrósio, Tratado sobre o Evangelho de São Lucas.

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